Emergência climática reitera integridade da Informação Ambiental

Com a população vulnerável ou predisposta a acreditar em narrativas que reforçam vieses ideológicos, publicações que descredibilizam o governo e exaltam influenciadores e atores de oposição ganham tração

Direito
10/07/2024
Yasmin Curzi de Mendonça

A emergência climática no Rio Grande do Sul tem sido agravada pela desinformação. Durante as chuvas e inundações, boatos sobre rompimentos de barragens, cortes de energia e escassez de alimentos, dificultam as operações de resgate e a comunicação eficaz das autoridades. Atores mal-intencionados capitalizam a situação, promovendo golpes e exacerbando o caos. Nesse cenário, governos e empresas de redes sociais e mensageria precisam assumir um compromisso sério com a integridade da informação, especialmente ambiental.

A desinformação se espalha rapidamente em tempos de crise. Com a população vulnerável ou predisposta a acreditar em narrativas que reforçam vieses ideológicos, publicações que descredibilizam o governo e exaltam influenciadores e atores de oposição ganham tração. O culto ao heroísmo seria menos problemático se não estivesse aliado ao negacionismo climático e à rejeição de políticas públicas para contenção de crises, transição energética e adaptação climática.

O ecossistema informacional, na era das plataformas baseadas em recomendação algorítmica, prioriza conteúdos que provocam emoções fortes, como indignação, raiva e medo. São eles os que mais cativam usuários – que comentam, curtem e compartilham mais este tipo de conteúdo. Logo, apesar de excelentes divulgadores científicos tomarem a cena com explicações detalhadas sobre a emergência climática, a competição pela atenção é injusta by default. Atores mal-intencionados se aproveitam dessa lógica para autopromoção, lucro ou com intenções políticas, fabricando desinformação e indignação para gerar mais engajamento. Enquanto isso, as plataformas oferecem o megafone algorítmico para aquilo que capturar mais a atenção. Cria-se um ciclo vicioso em que não há espaço para veracidade ou qualidade.

O caos informacional instalado, principalmente em relação à emergência climática, pode produzir efeitos devastadores em longo prazo. Governos e empresas precisam trabalhar juntos para promover a integridade da informação ambiental, garantindo que dados precisos e verificáveis sejam priorizados e amplamente disseminados.

O Acordo de Escazú – ainda pendente de aprovação no Congresso – tem o acesso à informação ambiental como um de seus pontos centrais. É a partir da transparência e dados sobre o meio-ambiente e clima que se torna possível co-criar um ciclo virtuoso de conhecimento a nível global, regional e local.

Em recente declaração conjunta, as Relatorias Especiais para a Liberdade de Expressão – ONU, OSCE, OEA e ACHPR – também ressaltaram que os Estados precisam aderir ao princípio de divulgação máxima sobre questões ambientais e climáticas, de maneira acessível e oportuna. Sublinharam ainda que empresas de plataformas devem adotar políticas de governança de conteúdo baseadas em direitos humanos, com atenção especial à moderação de conteúdo relacionado ao meio-ambiente e ao clima.

O combate à crise climática exige esforço, medidas efetivas e cooperação multissetorial. Para sua efetividade, a agenda da integridade da informação ambiental deve ser vista com prioridade. Ela deve englobar não apenas parcerias locais para combater desinformação, mas ações proativas como promoção de conteúdos de fontes verificadas, informações de qualidade e baseadas em evidências. Além disso, é crucial olhar para os sistemas de recomendação das plataformas digitais. Se falharmos em encarar essa discussão com a seriedade que ela exige, o engajamento vai engolir o futuro da humanidade.

*As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do(s) autor(es), não refletindo necessariamente a posição institucional da FGV.

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Autor(es)

  • Yasmin Curzi de Mendonça

    Professora na FGV Direito Rio, coordenadora de seu Programa Diversidade e Inclusão e Pesquisadora de seu Centro de Tecnologia e Sociedade, atuando desde 2019 com foco nas áreas de Direitos Humanos e Tecnologia, Regulação de Plataformas, Gênero e Democracia Digital. Doutora pelo IESP-UERJ, Mestre pela PUC-Rio, graduada em Direito e em Ciências Sociais pela FGV-Rio, com período de Intercâmbio Acadêmico na Université Sorbonne Paris-IV. Integrante do Comitê Nacional de Cibersegurança da Presidência da República.

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