Desenvolvimento econômico e social

Matemática para todos 

Priscilla Bacalhau

Ao final do ensino fundamental, só um quinto dos estudantes apresentam uma aprendizagem adequada nessa área 

Em uma sala de aula típica brasileira, apenas uma pequena minoria dos alunos está aprendendo o currículo esperado de matemática. No 5º ano do ensino fundamental, é menos da metade dos estudantes, mas essa proporção cai ao longo da vida escolar. Ao final do ensino fundamental é apenas um quinto dos estudantes que apresentam aprendizagem adequada, chegando a menos de 9% no ensino médio, segundo o Anuário Brasileiro da Educação Básica, com dados do Saeb 2023. 

O cenário é devastador. Imagine concluir a educação básica sem conseguir realizar operações simples de porcentagem, ou tendo dificuldade de entender o significado das referências numéricas mencionadas no parágrafo anterior. Possivelmente não é um exercício de imaginação muito complexo, uma vez que é bastante provável, estatisticamente, que você conheça alguém que não aprendeu o básico de matemática na escola - ou você mesmo seja essa pessoa. 

Em uma tentativa inédita na educação nacional para mudar esse contexto de forma sistêmica, foi instituído pelo governo federal o Compromisso Nacional Toda Matemática. O programa irá operar com base no regime de colaboração entre os entes federados, assim como outros programas já vêm priorizando para promover equidade e fortalecer a gestão territorial do ensino. O principal objetivo, ambicioso, é assegurar que todos os estudantes da educação básica desenvolvam as competências e habilidades estabelecidas para cada etapa. 

Além do regime que respeita a autonomia de cada ente, o programa prevê apoio técnico e financeiro para as redes de ensino, buscando garantir o básico para o ensino de matemática: formação de professores, materiais didáticos e outros recursos pedagógicos. A iniciativa também deve articular diferentes sistemas de avaliação, os quais devem subsidiar o acompanhamento sistemático da aprendizagem e embasar as decisões pedagógicas. Há ainda a previsão da disseminação de boas práticas, por meio de premiações - estratégia recorrente nesta gestão e que, isoladamente, tem eficácia limitada. 

A expectativa é de que estes esforços, se bem implementados, não demorem a dar os primeiros resultados já nas próximas avaliações. Na comparação internacional, os números são vergonhosos. Em avaliações internacionais como o Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes) e TIMSS (Estudo Internacional de Tendências em Matemática e Ciências), o Brasil recorrentemente figura entre os piores países do mundo em aprendizagem matemática. Estamos em um patamar tão baixo, com tantas desigualdades regionais, raciais e de gênero, que é razoável supor que uma estratégia sistêmica bem executada tem bastante potencial para melhorar a aprendizagem em matemática. 

Não aprender o suficiente dos números no começo da vida escolar pode levar a dificuldades persistentes e até à rejeição à disciplina. Não aprender o suficiente se constitui como uma barreira a carreiras mais promissoras em termos salariais. A matemática está presente em tudo o que fazemos na vida cotidiana, inclusive no entendimento de decisões políticas. Quando o Brasil não aprende o suficiente de matemática, se limita não apenas o desenvolvimento econômico, mas também o desenvolvimento de cidadãos para a cidadania e participação democrática. 

*Artigo publicado originalmente na Folha de S. Paulo em 09/10/2025 

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Autores

  • Priscilla Bacalhau
    Priscilla Bacalhau
    Pesquisadora do Centro de Aprendizagem em Avaliação e Resultados para a África Lusófona e o Brasil (FGV EESP CLEAR), doutora em economia e consultora de impacto social.  ver mais

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