Direito

Possíveis tensões envolvem a Lei Antidesmatamento da União Europeia: novos rumos para a regulação de florestas?

Paula Wojcikiewicz Almeida, Gabriel Ralile de Figueiredo Magalhães, Mariana de Brito Mariani, Lucas Lemos, Pedro Henrique Lavinas Ortman, Bianca Martins

A European Deforestation-Free Regulation (EUDR), iniciativa da União Europeia (UE) para combater o desmatamento, tem gerado preocupações quanto a potenciais repercussões econômicas globais. vA norma busca reduzir as emissões de gases de efeito estufa (GEE) e a perda de biodiversidade por meio do estabelecimento de regras relativas à comercialização de sete commodities no mercado da UE: gado, cacau, café, óleo de palma, borracha, soja e madeira. Apesar da entrada em vigor em 2023, as obrigações da EUDR só serão totalmente implementadas em dezembro de 2025 ou, no caso das pequenas e médias empresas, em junho de 2026.

Embora a EUDR não se aplique diretamente a países de fora da UE, possíveis efeitos extraterritoriais exigem que essas nações cumpram com o regulamento para que possam introduzir seus produtos no mercado da UE, a citar o Brasil. A peculiaridade do País está em sua extensa área florestal e seu importante papel no comércio internacional de commodities reguladas pela EUDR. Além disso, o Brasil abriga grande parte da Floresta Amazônica, uma das maiores florestas tropicais do mundo, cujo território está em risco de desmatamento.

Dada a complexidade da EUDR e suas obrigações que buscam englobar a totalidade das cadeias de valor, reações dentro e fora da UE têm criticado os elevados custos de conformidade e as ainda incertezas quanto a aspectos práticos envolvendo a implementação da norma. Posicionamentos nesse sentido, observados em países como Alemanha, Áustria, Brasil e Indonésia, têm também incluído pedidos para simplificação da norma.

A título de exemplo, em 22 de julho de 2025, a UE abriu consulta pública visando discutir potenciais simplificações de suas legislações ambientais, incluindo a EUDR. A iniciativa vem em consonância com medidas anteriores para simplificações de outras normas, como a Corporate Sustainability Due Diligence Directive (CSDDD), o Carbon Boarder Adjustment Mechanism (CBAM) e a Corporate Sustainability Reporting Directive (CSRD). 

Críticas comuns direcionadas à EUDR incluem potencial burocracia excessiva; dificuldades técnicas; riscos de responsabilidade legal; desvantagens competitivas para pequenas empresas; e exigências por simplificações, como a criação de uma categoria de “risco zero” para países com baixo risco de desmatamento, isentando-os de certas obrigações. Pouco tempo depois da consulta pública, a Comissão Europeia anunciou possível novo adiamento da norma devido a problemas técnicos relacionados ao Sistema de Informação, portal para submissão de documentos exigidos pela EUDR.

Diante do que aparentam ser “tensões” relacionadas à implementação da EUDR, observa-se necessidade de melhor compreender os desafios e oportunidades atrelados ao regulamento. Pesquisa conduzida pelo Centro de Pesquisa em Direito Global (CPDG) e Jean Monnet Centre of Excellence on EU-LA Global Challenges (CEJM), ambos coordenados pela professora da FGV Direito Rio Paula Wojcikiewicz Almeida, busca suprir essa lacuna ao averiguar quais são os desafios regulatórios que formuladores de políticas públicas e agentes econômicos no Brasil enfrentam quanto à implementação indireta da EUDR. O projeto "Monitoring the Impacts of the European Deforestation-Free Regulation (EUDR) in Brazil" analisa os impactos e oportunidades no País referentes à EUDR através de uma metodologia mista que inclui revisão bibliográfica e normativa, coleta e análise de dados de comércio internacional e realização de entrevistas semiestruturadas com stakeholders relevantes. A equipe do projeto é composta pela professora Paula e os pesquisadores Gabriel Ralile, Bianca Martins, Pedro Ortman, Mariana Mariani e Lucas Lemos. 

Além disso, a pesquisa também aborda outros mecanismos aplicáveis à proteção de florestas que possam dialogar com a EUDR. Por exemplo, analisam-se os acordos comerciais da UE e seus mecanismos de solução de controvérsia e desenvolvimento sustentável, particularmente abordando o caso do acordo UE-Mercosul. Além disso, averígua-se potencial interação entre a EUDR e o Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF), que visa financiar países que garantam a conservação de suas florestas.

Em que pesem as possíveis “tensões” ao redor da EUDR demandarem simplificações, e inclusive novo adiamento, a compreensão quanto aos seus dispositivos e implicações práticas, em um contexto de interação com outras iniciativas, propicia a prospecção de cenários e recomendações para uma implementação eficiente da norma, assim provendo insumos para tomadores de decisão.

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Autores

  • Paula Wojcikiewicz Almeida
    Professora da FGV Direito Rio, coordenadora do Centro de Pesquisa em Direito Global (CPDG) e do Centro de Excelência Jean Monnet EU-South-America Global Challenges, co-financiado pela Comissão…  ver mais
  • foto do Gabriel Ralile
    Gabriel Ralile de Figueiredo Magalhães
    Doutorando em Direito da Regulação na FGV Direito Rio. Pesquisador do Centro de Pesquisa em Direito Global (CPDG) da Escola de Direito do Rio de Janeiro (FGV Direito Rio).  ver mais
  • Mariana de Brito Mariani
    Pesquisadora no Centro de Pesquisa em Direito Global (CPDG) da FGV Direito Rio. Mestre em Direito Internacional Summa Cum Laude pela Universidade de Glasgow, com especialização em Direito Ambiental e…  ver mais
  • Lucas Lemos
  • Pedro Ortman
    Pedro Henrique Lavinas Ortman
    Mestrando em Direito Internacional e Europeu na Universidade Católica Portuguesa no Porto (Portugal), graduado em Direito pela Universidade de Coimbra (Portugal) e pesquisador do Centro de Pesquisa…  ver mais
  • Bianca Martins
    Researcher at FGV Centre for Global Law  ver mais

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