Reforma tributária no Brasil: afinal, imposto é roubo?

Podemos comparar a vida em sociedade a um grande condomínio: mesmo que não utilizemos todos os recursos disponíveis, todos pagamos a taxa de condomínio.

Economia
23/08/2024
Rogiene Batista dos Santos

Em 1789, Benjamin Franklin afirmou que “há somente duas certezas no mundo: a morte e os impostos”. Como a própria palavra indica, o imposto é algo “imposto” pelos governantes. Portanto, não podemos escolher se pagaremos ou não os impostos (considerando viver dentro da legalidade). Por este motivo, é fundamental compreendermos o papel dos impostos numa sociedade organizada e a necessidade da reforma tributária no Brasil. Mas para algumas pessoas, imposto é roubo. Será que é isso mesmo?

A origem dos impostos remonta às civilizações antigas, como Egito, Mesopotâmia, Grécia e Roma. Desde esses tempos, observa-se que em sociedades organizadas, os impostos são essenciais para que os governos tenham recursos financeiros para promover o bem-estar social. A principal fonte de receita dos governos vem dos impostos, que permitem investimentos em educação, infraestrutura, saúde, programas de assistência social e segurança pública. Sem os impostos, o governo seria incapaz de oferecer esses serviços essenciais para o desenvolvimento econômico e social do país.

Muitas pessoas podem questionar que não utilizam diretamente alguns desses serviços, sentindo que estão pagando por algo que não usufruem. É compreensível. No entanto, viver em sociedade demanda entender o conceito de coletividade. Podemos comparar a vida em sociedade a um grande condomínio: mesmo que não utilizemos todos os recursos disponíveis, todos pagamos a taxa de condomínio.

Para compreendermos o papel dos impostos nas nossas vidas, precisamos entender como eles são divididos no Brasil. Atualmente, temos cinco categorias de tributos: impostos, contribuições, taxas, contribuições de melhorias e empréstimo compulsório.

Os impostos são divididos em:

  • Federais: Incidem sobre diversas bases econômicas, como renda, lucro, produção, consumo e transações financeiras. Exemplos incluem o Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF).
  • Estaduais: Regulamentados pelas legislações de cada estado, como o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).
  • Municipais: Recolhidos pelos municípios, como o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS).

O atual sistema tributário brasileiro é complexo, permitindo oportunidades para sonegação de impostos. Com menos tributação, os governos têm menos recursos disponíveis para atingir seus objetivos de promover o bem-estar social. De 01/01/2024 a 21/07/2024, o governo brasileiro arrecadou cerca de R$ 2 trilhões em impostos. No entanto, segundo o sonegômetro, no Brasil, há uma perda anual de cerca de R$ 600 bilhões devido à sonegação. Além disso, segundo os dados da OCDE, o Brasil é um dos países com maior carga tributária.

Apesar dos problemas, não compartilho da visão de que imposto é roubo por três motivos principais:

  • Solidariedade Social: Vivemos em sociedade e há pessoas em situação desfavorável. O estado precisa garantir o mínimo de dignidade a essas pessoas.
  • Desenvolvimento Econômico e Social: A arrecadação de impostos é fundamental para o desenvolvimento do país.
  • Promoção da Igualdade de Oportunidades: Investimentos em programas educacionais, como o Prouni, são essenciais para promover igualdade.

Minha principal crítica está na alocação dos recursos dos impostos por parte dos governantes. O dinheiro público deveria ser utilizado de maneira mais eficaz para trazer retorno à sociedade. Infelizmente, o que vemos muitas vezes é o oposto: governantes utilizando o dinheiro público para benefício próprio. A corrupção é uma métrica importante para verificar a utilização do dinheiro público, pois diminui os recursos disponíveis para promover o bem-estar social. O Índice de Percepção da Corrupção coloca o Brasil entre os países com alto nível de corrupção, com nota 38. A Dinamarca, por exemplo, tem a maior nota (altamente íntegro).

Reforma Tributária: Caminho para a Eficiência e Justiça

Por mais de 30 anos a reforma tributária tem sido discutida no Brasil. A   PEC 45/2019, também conhecida por PEC da reforma tributária, visa simplificar o sistema tributário brasileiro.

A discussão sobre a reforma tributária faz-se necessária pois é necessário modernizar o sistema tributário brasileiro e torná-lo mais eficiente e justo. Desta forma, a reforma visa simplificar a estrutura tributária, reduzir a carga sobre o consumo e aumentar a progressividade, aliviando o peso sobre os mais pobres e garantindo que os impostos sejam proporcionais à capacidade de pagamento dos cidadãos.

Por fim, ela busca combater a sonegação fiscal e melhorar a arrecadação sem aumentar a carga tributária total, possibilitando um melhor uso dos recursos públicos. Caso essa reforma seja bem-sucedida, ela pode fomentar o crescimento econômico, aumentar a competitividade do país e promover uma distribuição mais equitativa da riqueza.

Em resumo, a nossa inquietude não deveria ser se o imposto é roubo ou não, mas sim como os recursos públicos estão sendo utilizados pelos governantes que elegemos. Um dos nossos papéis como cidadãos é acompanhar e fiscalizar os gastos públicos, pois somos nós que pagamos a conta. O fortalecimento da fiscalização e a exigência de transparência são essenciais para garantir que os impostos arrecadados sejam revertidos em benefícios para toda a sociedade.

*As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do(s) autor(es), não refletindo necessariamente a posição institucional da FGV.

Do mesmo autor

Autor(es)

  • Rogiene Batista dos Santos

    Professora e pós-doutoranda na linha de finanças na FGV EAESP. Doutora em Controladoria e Contabilidade pela Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto (FEARP/USP) com Doutorado-Sanduíche pelo MIT (Massachusetts Institute of Technology - Sloan School of Management). É mestre em Controladoria e Contabilidade pela FEARP/USP e possui graduação em Administração pelo Instituto Baiano de Ensino Superior e especialização em Gestão Estratégica de Negócios pelo Instituto Adventista de Ensino do Nordeste e graduação em contabilidade pela Universidade de Franca. 

Artigos relacionados

Últimos artigos

Esse site usa cookies

Nosso website coleta informações do seu dispositivo e da sua navegação e utiliza tecnologias como cookies para armazená-las e permitir funcionalidades como: melhorar o funcionamento técnico das páginas, mensurar a audiência do website e oferecer produtos e serviços relevantes por meio de anúncios personalizados. Para mais informações, acesse o nosso Aviso de Cookies e o nosso Aviso de Privacidade.