Direito

A responsabilidade do/a síndico/a nos casos de violência doméstica

Luciano de Souza Godoy

Como noticiado em setembro de 2021, foi aprovada, sancionada e publicada no Lei Estadual 17.406/2021, com vigência em todo o Estado de São Paulo, que cria uma nova obrigação aos condomínios residenciais ou comerciais – combater a violência doméstica. Se traz obrigação ao condomínio, imputa ao seu representante legal (os síndicos/as ou administradores/as) o dever legal de denunciar às autoridades competentes “a ocorrência ou indícios de episódios de violência doméstica e familiar contra mulheres, crianças, adolescentes ou idosos”.

A lei foi merecidamente celebrada. Busca romper com as ocorrências disseminadas pelo país de que brigas entre casais devem ser resolvidas apenas no ambiente privado e íntimo da família – o famoso bordão “em briga de marido e mulher não se mete a colher”! Essa cultura ultrapassada é criticada em campanhas de conscientização e movimentos de denúncia à violência doméstica por um rompimento do silêncio por parte dos vizinhos, da comunidade do condomínio e, em particular, atribui ao síndico um olhar mais amplo e criterioso do que ocorre no edifício sob sua gestão.

A norma prevê que a denúncia deve ser realizada de imediato em ocorrências em andamento ou em até 24 horas após a ciência do fato, com informações que permitam às autoridades identificar vítima(s) e agressor. E por último, obriga os condomínios a afixar, nas áreas de uso comum, cartazes que informem e incentivem os condôminos a notificarem a ocorrência de casos de violência doméstica ou familiar nas unidades condominiais.

Uma das principais preocupações quanto à aplicação da nova lei se refere a ausência de penalidade prevista para descumprimento da obrigação de comunicação. Segundo notícia publicada no site da Assembleia Legislativa de São Paulo, o artigo que previa multa de R$ 2.900,00 para tais casos foi vetado pelo Executivo[1], isto é, no Estado de São Paulo ainda não há pena pecuniária. Outros Estados que já possuem a mesma previsão legal chegam a impor multas de até R$ 10.000,00[2].

Com ou sem penalidade, não deixa de ser uma lei importante na construção de responsabilidade coletiva e social em torno do combate à violência doméstica e familiar.

Sabemos que os síndicos em geral centralizarão essa função, até por que é responsabilidade deles “representar, ativa e passivamente, o condomínio, praticando, em juízo ou fora dele, os atos necessários à defesa dos interesses comuns”, segundo o que dispõe o inciso II, do artigo 1348 do Código Civil.

Contudo, devemos nos preocupar em instruir e garantir que os síndicos, mas especialmente as síndicas dos condomínios estejam preparadas e saibam como intervir nas ocorrências de violência doméstica de forma segura para elas e para as vítimas.

Será interessante que as empresas administradoras capacitem pessoas que exercem essa função por meio de cursos e ofereçam instrumentos que garantam o cumprimento da nova obrigação legal, que ainda será regulamentada pelo Governo do Estado de São Paulo. Mas é também responsabilidade do condomínio garantir o exercício da atividade de síndico sem risco.

Se a pena pecuniária foi vetada na lei paulista, nada impede que os condomínios estabeleçam normas internas em seus estatutos e regimentos com multas aos infratores, até mesmo com possibilidade de exclusão do condômino antissocial.

Mecanismos como aplicativos com botões de socorro, canais de denúncia anônima entre os condôminos e síndicos, dentre outros, podem ser uma boa forma de estender e coletivizar a responsabilidade para se garantir o cumprimento da lei, a segurança de todas as partes, enaltecendo o valor que a nova lei traz – romper o silêncio da violência doméstica nos apartamentos.

 

[1] https://www.al.sp.gov.br/noticia/?16/09/2021/executivo-sanciona-lei-criada-na-alesp-que-obriga-condominios-a-denunciarem-casos-de-violencia-domestica-

[2] https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/lei-obriga-sindico-a-denunciar-violencia-domestica-predio-usa-botao-de-socorro/

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  • Luciano de Souza Godoy

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