Tecnologia 5G: Patentes e Direito de Acesso

Para que os aparelhos se conectem entre si por meio do 5G, eles devem possuir tecnologia padronizada, inclusive internacionalmente, de forma que os aparelhos ao redor do mundo estejam aptos a distribuir e receber esse sinal.

Direito
02/08/2023
Guilherme Carboni
Paula Westenberger
Fernanda Galera Soler
Ana Luiza de Faria Canassa
Camila Vilela
Carolina Mansinho Galdino
Laura Rios

A tecnologia 5G promete dar um grande impulso para a indústria e os serviços em geral, especialmente por meio da chamada internet das coisas (IoT), que conecta aparelhos entre si e estes com pessoas a uma altíssima velocidade e com latência próxima ao zero. Além disso, setores essenciais, como saúde, educação, transporte, entre outros, serão bastante beneficiados com a tecnologia 5G. 

Para que os aparelhos se conectem entre si por meio do 5G, eles devem possuir tecnologia padronizada, inclusive internacionalmente, de forma que os aparelhos ao redor do mundo estejam aptos a distribuir e receber esse sinal. Por serem inovadoras, essas tecnologias padronizadas podem ser patenteadas por algumas empresas. As patentes de tecnologias que se tornam imprescindíveis para a implementação de um certo padrão eleito para determinada indústria são denominadas patentes essenciais, com base em análises feitas pelas instituições técnicas de padronização responsáveis pelo setor. No ramo das telecomunicações, são exemplos de patentes essenciais as tecnologias para WiFi, Bluetooth e 3G ou 4G. 

Tendo em vista a importância das tecnologias padronizadas para que terceiros possam utilizá-las de forma acessível, o licenciamento de patentes essenciais, por parte de seus titulares, deve respeitar o princípio FRAND (fair, reasonable and non discriminatory – em português: justo, razoável e não discriminatório). Contudo, como não existe um comum acordo sobre o significado desses termos, não é difícil supor que, apesar da busca por equilíbrio de interesses, as negociações envolvendo o licenciamento de patentes essenciais rendem diversas disputas judiciais, como as que envolveram a Apple e a Ericsson no final de 2022. 

Portanto, a adoção do princípio FRAND para resolver questões envolvendo o licenciamento de patentes essenciais está longe de ser a solução para a ampliação do uso dessas patentes a um preço justo, além da sua eficácia ser duvidosa, considerando as diferentes economias e capacidades produtivas, especialmente em países subdesenvolvidos e em desenvolvimento, como é o caso do Brasil. 

Além disso, nem sempre é possível o amplo acesso à tecnologia 5G por países subdesenvolvidos e em desenvolvimento. Isso porque tais países, muitas vezes, não possuem o mesmo patamar de proteção de patentes existente em países desenvolvidos. Sem contar com o fato de que a executabilidade dos direitos de propriedade intelectual pode ser mais fraca nesses países, o que leva os titulares de patentes essenciais a licenciá-las de modo mais severo, flexibilizando o FRAND. 

Assim, é preciso repensar a forma pela qual as patentes essenciais podem ser acessadas mais amplamente no setor para o qual ela está voltada e se o FRAND é a solução para essa questão. Ainda mais se considerarmos que o próprio processo de indicação de um determinado padrão tecnológico envolve questões políticas, econômicas e interesses diversos, nem sempre garantindo espaço de negociação para países do Sul Global, por exemplo. 

Diante deste cenário, ainda que muito se fale da tecnologia 5G e de sua importância, há que se pensar em um melhor balanceamento entre proteção e acesso às patentes essenciais que a envolvam, de forma a tornar essa tecnologia mais acessível a quem se interessar pela exploração comercial de produtos e serviços a ela atrelados, o que certamente impactará na inclusão de um maior número de pessoas aos benefícios por ela gerados.

*As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do(s) autor(es), não refletindo necessariamente a posição institucional da FGV.

Autor(es)

  • Guilherme Carboni

    Docente da Escola de Direito de São Paulo (FGV Direito SP) desde 2017 e coordenador do Grupo de Propriedade Intelectual, Direitos Humanos e Inclusão (GPIDHI) na Escola. Pós-Doutorado pela Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP, financiado pela FAPESP. Doutor e Mestre em Direito Civil pela Faculdade de Direito da USP. Pesquisador visitante em Sociologia do Direito na Università Degli Studi di Milano, Itália. Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da USP. Advogado em São Paulo.

  • Paula Westenberger

    Senior Lecturer in Intellectual Property Law at Brunel University London e pesquisadora do Grupo de Propriedade Intelectual, Direitos Humanos e Inclusão (GPIDHI) da Escola de Direito de São Paulo (FGV Direito SP). 

  • Fernanda Galera Soler

    Professora da Escola de Direito de São Paulo (FGV Direito SP). Vice-coordenadora do Grupo de Propriedade Intelectual, Direitos Humanos e Inclusão (GPIDHI) da Escola. Doutoranda e Mestre em Direito Comercial, com foco em Propriedade Intelectual, pela Universidade São Paulo. Visitante acadêmica da Faculdade de Direito da Universidade de Oxford. Especialista em Propriedade Intelectual pela Escola Superior de Advocacia da Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo. Cursando Master in Business Innovation (MBI) na Universidade Federal de São Carlos. Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo. Advogada recomendada para o segmento de "Startups & Inovação - Escritórios de Advocacia", Leaders League. 

  • Ana Luiza de Faria Canassa

    Advogada com experiência no setor consultivo e atuação voltada a Propriedade Intelectual, com foco em Direitos Autorais. Mestre em Direito Civil, com pesquisa na subárea de Direitos Autorais e pesquisadora do Grupo de Propriedade Intelectual, Direitos Humanos e Inclusão (GPIDHI) da Escola de Direito de São Paulo (FGV Direito SP). 

  • Camila Vilela

    Pesquisadora do Grupo de Propriedade Intelectual, Direitos Humanos e Inclusão (GPIDHI) da Escola de Direito de São Paulo (FGV Direito SP). Advogada com experiência nas áreas de Proteção de Dados e Privacidade, Propriedade Intelectual e Direito da Tecnologia da Informação e Comunicação. Mestranda em Direito Intelectual pela Universidade de Lisboa.

  • Carolina Mansinho Galdino

    Pesquisadora do Grupo de Propriedade Intelectual, Direitos Humanos e Inclusão (GPIDHI) da Escola de Direito de São Paulo (FGV Direito SP). Advogada com experiência em contencioso cível estratégico (responsabilidade civil, consumidor, e propriedade intelectual). Especializada em Propriedade Intelectual, atua com contratos, contencioso cível, consultivo e processo administrativo, especialmente na área de marcas e direitos autorais. Possui curso de extensão em Direitos dos Negócios na Internet (FGV Direito SP). Pós-graduada em Propriedade Intelectual, Mídia e Entretenimento (ESA-OABSP). 

  • Laura Rios

    Advogada, pós-graduanda em Propriedade Intelectual e Direito do Entretenimento pela Escola Superior da Advocacia da OAB SP (ESAOABSP) e pesquisadora do Grupo de Propriedade Intelectual, Direitos Humanos e Inclusão (GPIDHI) da Escola de Direito de São Paulo (FGV Direito SP). O grupo realiza pesquisas sobre possíveis alterações no sistema da propriedade intelectual (abrangendo seus dois pilares: a propriedade industrial e os direitos autorais), de forma a estabelecer um melhor balanceamento entre, de um lado, o incentivo à criatividade e à inovação e, de outro, o acesso e a inclusão por meio de um diálogo com os direitos humanos.

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