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Carlos Pereira, da FGV EBAPE, é o primeiro brasileiro a receber o Prêmio Guillermo O’Donnell da IPSA

Reconhecimento internacional destaca contribuição inovadora do pesquisador para o entendimento do presidencialismo multipartidário na América Latina

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Professor Carlos Pereira

Carlos Pereira, PhD e professor titular da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas (FGV EBAPE), foi o vencedor do 2025 IPSA Guillermo O’Donnell Prize for Latin American Scholars. A premiação, oferecida pela Associação Internacional de Ciência Política (IPSA), é o mais alto reconhecimento global para cientistas políticos da América Latina. Com esta conquista, Pereira torna-se o primeiro brasileiro a receber essa honraria. 

O prêmio reconhece a trajetória intelectual e as contribuições teóricas que impactaram de forma significativa a ciência política comparada, especialmente no que se refere à interpretação do presidencialismo multipartidário. Desafiando a visão tradicional de disfunção e instabilidade, suas pesquisas identificaram condições institucionais que permitem ordem, previsibilidade e governabilidade democrática mesmo em sistemas fragmentados, como o brasileiro. 

“Embora o prêmio seja individual, vejo como um reconhecimento coletivo à minha geração de cientistas políticos no Brasil”, afirma o professor

Ao dividir a conquista com referências históricas e contemporâneas da área, Pereira também destaca a relevância dos conceitos fundamentais criados por Guillermo O’Donnell — como “democracia delegativa” e “accountability horizontal” — para sua formação acadêmica e trabalho atual. 

A seguir, o professor Carlos Pereira fala sobre o impacto de sua pesquisa, os desafios enfrentados, a contribuição coletiva da ciência política brasileira e os dilemas que o campo enfrentará nos próximos anos: 
 
⁠Como o senhor enxerga o impacto da sua interpretação sobre o presidencialismo multipartidário na ciência política latino-americana e no debate internacional?
 
Durante muito tempo, o presidencialismo com multipartidarismo era visto como instável. Minha pesquisa, junto a outros cientistas políticos brasileiros, mostrou que esse arranjo pode gerar ordem, desde que três condições estejam presentes: presidente com poderes constitucionais relevantes, capacidade de distribuir incentivos legais (como cargos e emendas) e instituições de controle atuantes. Essa visão ajudou a reequilibrar o debate internacional, oferecendo uma perspectiva mais realista sobre a governabilidade latino-americana. 

⁠Quais foram os principais desafios enfrentados ao propor uma visão alternativa ao paradigma dominante sobre os sistemas políticos da América Latina? 

O maior desafio foi desenvolver uma teoria explicativa baseada em evidências concretas, demonstrando que presidentes com poderes relevantes conseguem formar coalizões mesmo em contextos fragmentados. Esses mecanismos legais incentivam o apoio legislativo e reduzem incertezas eleitorais. Embora tenha demorado, essa perspectiva se consolidou na política comparada latino-americana. 

⁠O senhor menciona que divide esse prêmio com uma geração de cientistas políticos brasileiros. Que avanços o senhor acredita que essa geração trouxe para o campo?
 
A nova interpretação é fruto de um esforço coletivo. A troca crítica entre pares permitiu a formulação de hipóteses sólidas testadas com dados de alta qualidade. O resultado foi um conhecimento consistente, com publicações de alto impacto que reposicionaram o Brasil como referência empírica na ciência política comparada. 

Receber um prêmio com o nome de Guillermo O’Donnell certamente tem um peso simbólico. Como os conceitos dele influenciaram sua trajetória e seu trabalho acadêmico? 

É uma grande honra. O’Donnell foi fundamental para o desenvolvimento da ciência política latino-americana, criando conceitos como “accountability horizontal” e “democracia delegativa”. Esses termos moldaram minha formação e influenciam diretamente minha forma de interpretar instituições e desafios democráticos na região. 

Na sua opinião, quais são os grandes temas e dilemas que a ciência política latino-americana deve enfrentar nos próximos anos? 

Destaco quatro agendas principais: 
(1) Estudar os fatores que explicam a atual estabilidade democrática; 
(2) Compreender como agentes de justiça reagem a ameaças políticas; 
(3) Avaliar os efeitos do fortalecimento do Legislativo sobre o presidencialismo de coalizão; 
(4) Analisar os impactos das reformas eleitorais recentes sobre fragmentação, coesão partidária e equilíbrio federativo. 
Esses temas são essenciais para reposicionar a ciência política latino-americana no debate global.