Direitas, volver
Quando se trata de classificar a ideologia dos atores políticos, normalmente utilizamos as categorias esquerda, centro e direita. Essa tipologia, porém, está longe de ser perfeita e de dar conta da pluralidade de cada um dos lados.
Os cientistas políticos Timothy Power e Rodrigo Rodrigues-Silveira argumentam que, no Brasil, existem pelo menos quatro tipos de direita. Duas são definidas por políticas públicas: uma defende o liberalismo econômico e outra o conservadorismo moral. Impulsionada pelo bolsonarismo, há ainda uma direita nostálgica da ditadura militar.
De certo modo, essa terceira direita tem ofuscado a "direita pragmática," o quarto tipo, que prevalecia na maioria dos municípios, articulada pelas elites locais e flexível em suas alianças para manter o poder. Frequentemente, essa direita pragmática é confundida com o centro.
Em 2004, essas quatro direitas (o centro incluso) perderam espaço nas eleições municipais com a primeira vitória de Lula dois anos antes. Utilizando os dados do Cepesp-Data e classificando os partidos com base em uma adaptação dos estudos de Bruno Bolognesi, Ednaldo Ribeiro e Adriano Cotado, percebemos que, ainda em 2000 durante o governo de FHC, direita e centro controlavam quase 90% das prefeituras.
Ao longo dos anos, muito por conta dos pragmáticos, direita e centro mantiveram a maioria dos municípios, mas reduziram sua dominância para algo em torno de 70% das prefeituras em 2012. O período marcou o auge da esquerda, que praticamente triplicou o número de prefeitos eleitos em relação ao ano 2000. Esse realinhamento natural refletia a dinâmica política no âmbito federal, em que a terceira vitória consecutiva do PT para a Presidência em 2010 se reproduzia nos pleitos municipais. Não é surpreendente, portanto, o que aconteceu nos anos seguintes.
O impeachment de Dilma, a prisão de Lula e a ascensão de Bolsonaro impulsionaram o conservadorismo moral e o militarismo nostálgico, fortalecendo o centro e a direita tanto nas eleições federais quanto nas municipais. Em 2016 e 2020, a esquerda perdeu o grande volume de prefeituras que havia conquistado na Era PT.
Para 2024, seria razoável esperar uma estagnação nesse retorno da direita, considerando a vitória de Lula sobre Bolsonaro em 2022. No entanto, os resultados do primeiro turno disponibilizados pelo TSE foram em outra direção. Os partidos de direita elegeram mais prefeitos em 2024 que em 2000. Apesar do crescimento do PT, a esquerda como um todo perdeu cerca de 10% das prefeituras conquistadas em 2020. O centro, por sua vez, encolheu em torno de 5%.
É ainda difícil dizer com precisão em qual das quatro categorias de Power e Rodrigues-Silveira se enquadram os quase 2.500 prefeitos eleitos pela direita em 2024 (mais de 4.700 se considerarmos centro e direita). Uma interpretação plausível é que, como era comum no passado, os partidos pragmáticos foram os responsáveis pela nova distribuição ideológica das prefeituras. No entanto, isto não parece ser o caso, dado a redução dos partidos classificados como centristas.
Parece que as direitas bolsonaristas, defensoras do conservadorismo moral e do militarismo nostálgico, aumentaram seu espaço, evidenciando o clima polarizado em que vivemos. Com o ex-presidente inelegível, esse resultado ressalta a importância de acompanharmos a escolha do sucessor de Bolsonaro para as eleições de 2026.