Pesquisa mostra que área de legal operations cresce no mercado jurídico brasileiro
Avanço tecnológico aliado a uma característica peculiar do Brasil está impulsionando o desenvolvimento da área de operações legais.

O avanço tecnológico, especialmente pós-pandemia, aliado a uma característica peculiar do Brasil – a grande quantidade de processos judiciais, que segundo o último relatório do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), divulgado em 2024, alcançou 84 milhões de litígios –, está impulsionando o desenvolvimento de uma nova área no mercado de serviços jurídicos do país: a área de operações legais, ou, como é chamada na versão em inglês, legal operations, ou apenas legal ops.
A pesquisa Legal Operations: Perspectivas de inovação e gestão jurídica, realizada pelo Centro de Ensino e Pesquisa em Inovação (CEPI) da FGV Direito SP, se dedicou a compreender as oportunidades e os desafios relacionados à criação e atuação do legal ops em escritórios e departamentos jurídicos brasileiros pela perspectiva da inovação jurídica. A área já havia aparecido com destaque em pesquisa anterior do CEPI sobre habilidades e competências da advocacia, tendo sido apontada como uma das principais áreas criadas em escritórios nos últimos cinco anos.
Mas o que é legal operations? Trata-se de uma função ou área estruturada, em escritórios de advocacia ou departamentos jurídicos, composta por uma ou mais pessoas responsáveis por um conjunto de determinadas atribuições, que podem ser operacionais e/ou estratégicas. As operacionais abarcam uma dimensão administrativa, a exemplo de tarefas de gestão, como realização de pagamentos e gerenciamento de fornecedores, e uma dimensão de otimização, com vistas a organizar e melhorar os processos existentes. As estratégicas buscam a maximização de resultados por meio de inteligência de dados, incorporação de tecnologias, legal design etc., dando suporte à prática jurídica. As atividades desempenhadas pelo legal ops também podem ser ofertadas enquanto serviços a terceiros, o que é conhecido como “legal ops as a service”.
De acordo com as organizações participantes do survey realizado pelo CEPI para a construção do panorama do legal ops no Brasil, a criação da área ocorreu, especialmente, a partir de 2016, mas com muito mais incidência nos anos de 2020 a 2024. Entre os anos de 2016 e 2019, destaca-se a expansão em departamentos jurídicos, enquanto o movimento de emergência nos escritórios ocorre posteriormente, sobretudo entre os anos 2020 e 2024. Entre as organizações participantes, há poucos registros de implementações anteriores a esses marcos, sendo uma datada de antes dos anos 2000 e outra entre 2000 e 2010, conforme demonstra o gráfico abaixo
Criação da área de legal operations no Brasil
Fonte: Elaboração do CEPI a partir do survey
A pesquisa ainda se dedicou a compreender a motivação por trás da criação da área de legal ops nas organizações. Dentre os motivos mencionados, destacou-se a busca por otimização de recursos e aumento da eficiência, conforme indicado no quadro abaixo. Essa busca pode ser reforçada no âmbito das organizações jurídicas brasileiras por uma particularidade local: o grande volume de processos judiciais. A alta judicialização e a cultura da litigância no Brasil foram apontadas como fator que favorece sua expansão no país por demandar o gerenciamento de grande volume de processos, especialmente no contexto do contencioso de massa, mas também nas áreas trabalhista e tributária. Além disso, a digitalização, acompanhada das transformações tecnológicas e de gestão, faz com que as informações precisem ser transmitidas e assimiladas de forma mais rápida e efetiva. O legal ops seria, então, uma espécie de ferramental para responder a essa demanda por rapidez.
Principais motivações para a criação da área de legal ops
Portas abertas para profissionais de outras áreas de conhecimento
A pesquisa ainda encontrou outros resultados relacionados ao funcionamento e formação da área de legal operations.
- O legal ops pode funcionar como uma plataforma de integração de diversas atividades, setores, tecnologias e parceiros de uma organização, fomentando a inovação jurídica pela perspectiva da gestão. Ele não se resume a demandas jurídicas e é fortemente marcado por elementos de tecnologia e gestão.
- Não há um padrão ou uniformidade entre as organizações que possuem a área ou funções atreladas ao legal ops. A área pode ter propósitos distintos, a depender do objetivo e momento de cada organização. Há atribuições mais operacionais (geralmente associadas ao backoffice) e outras mais estratégicas (envolvendo, por exemplo, inteligência de dados, desenvolvimento de negócios etc.).
- Há diversidade no perfil dos(as) profissionais que atuam com legal ops, sendo pessoas com ou sem formação jurídica, com ou sem inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Essas pessoas atuam em equipes dedicadas ou trabalham de forma transversal entre departamentos. É marcante a interdisciplinaridade na área. Além de profissionais com formação em Direito, a pesquisa revela forte presença de profissionais com outras formações, tais como Administração, Economia, Engenharia e Ciência de Dados.
- O legal ops é visto por muitos como uma oportunidade de valorização dos (das) paralegais, apesar do avanço da automação. A justificativa seria que o legal ops incorpora uma abordagem estratégica a atividades antes tidas como meramente operacionais.
- Legal ops e controladoria jurídica não são sinônimos. Enquanto a controladoria se dedica a uma atuação mais financeira e de controle (de despesas, de prazos etc.), o legal ops vai além. A conexão entre as áreas varia de acordo com a organização. Há organizações em que a controladoria é abarcada pelo legal ops, enquanto em outras são instâncias paralelas e independentes.
- As tecnologias aparecem como parceiras do legal ops. Embora a preocupação com a automação e a substituição do trabalho humano tenha sido relevante na pesquisa, os resultados indicam uma visão mais otimista sobre o impacto da tecnologia, como potencial facilitador do trabalho da advocacia e da gestão – disponibilizando e processando informações mais rapidamente, automatizando tarefas repetitivas e liberando tempo para o(a) advogado(a) desempenhar atividades mais complexas.
Metodologia da pesquisa
Para a construção do panorama de legal ops no Brasil, foi realizado um survey para coletar informações de organizações que possuem uma área estruturada e/ou que, embora não possuam uma área formalmente chamada de legal ops, alegam possuir funções relacionadas. O survey contou com 91 respostas (30 escritórios de advocacia, 44 departamentos jurídicos e 17 lawtechs, legaltechs, consultorias ou outros tipos de organizações). A pesquisa envolveu ainda informações coletadas por meio de entrevistas semiestruturadas com atores relevantes e engajados com o legal ops no país, além de pesquisa bibliográfica e estudos de casos aplicados com três grupos (escritórios, departamentos jurídicos e empresas que ofertam o legal ops como serviço jurídico).
Os resultados finais da pesquisa serão publicados em 27 de março, em evento realizado na FGV Direito SP. Para se inscrever, acesse Panorama do Legal Operations no Brasil | FGV DIREITO SP.
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