Políticas Públicas

Doar Sangue: uma ação cidadã

Autor
Ana Maria Malik
Alberto José Niituma Ogata
Data

A doação de sangue é um ato essencial para salvar vidas. A transfusão de sangue é frequentemente indispensável em situações como cirurgias, tratamentos oncológicos, atendimento de vítimas de acidentes e casos graves de doenças crônicas.  No Brasil, o Dia Nacional do Doador de Sangue, celebrado em 25 de novembro, tem como objetivo conscientizar a população sobre a importância desse gesto e homenagear os doadores. 

A Organização Mundial de Saúde (OMS) destaca que o percentual ideal de doadores de sangue, mundialmente, seria de 3 a 5% da população, mas no Brasil o indicador está abaixo desse índice. Alguns fatores podem ser destacados como barreiras para a doação de sangue no país.  Por exemplo, há falta de conhecimento da população sobre a importância deste ato, dificuldades logísticas para a doação, sazonalidade nas doações e ainda inaptidão clínica e sorológica de indivíduos que se dispõem a doar. Não se pode tampouco esquecer dos custos em que se incorre para garantir a segurança transfusional. Estes fatores podem ser controlados por políticas públicas, campanhas e alocação de orçamento, mas os mitos e as “fake news” que envolvem o assunto são muito mais difíceis de contornar.   

Na América Latina e no Caribe desde 2015 menos de 50% do sangue disponível para transfusões foi obtido por meio de contribuições espontâneas do público, que é a forma mais segura para coletar sangue, de acordo com a Organização Mundial da Saúde -OMS/Organização Pan-Americana Mundial da Saúde – OPAS.  Afinal, quem se dispõe a doar por espírito de solidariedade em geral espera estar em boas condições. Quando outro tipo de impulso está por trás, o menos importante é como a pessoa se sente.

Seja como for, uma questão recorrente ligada ao assunto “doação de sangue” é, sem dúvida, o decréscimo, a estabilização ou a dificuldade/incapacidade de aumentar o número de doadores no país, conforme documentos oficiais publicados a partir de  2015. No Brasil, para atrair novos doadores, são criadas estratégias e campanhas de comunicação, apoiadas pelo Ministério da Saúde (MS) e pelos hemocentros, a fim de dar visibilidade ao problema e disseminar informações, o que nem sempre resulta em um aumento no número ou na fidelização de doadores de sangue. O Manual de Orientação para Promoção da Doação Voluntária de Sangue, publicação do Ministério da Saúde e de distribuição gratuita para aqueles profissionais que atuam no contato com os doadores de sangue é uma dessas estratégias e pretende contribuir para uniformizar suas práticas nacionalmente, respeitando as diversidades regionais, de modo a servir como suporte técnico para o trabalho realizado no cotidiano dos serviços de hemoterapia do Brasil. 

O Brasil possui uma Política Nacional de Sangue, Componentes e Hemoderivados que tem por finalidade garantir a autossuficiência do País nesse setor e harmonizar as ações do poder público em todos os níveis de governo no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). No entanto, nem sempre foi assim. O Centro de Hematologia e Hemoterapia do Estado do Rio de Janeiro – HEMORIO, criado na década de 1940 marca o início do serviço de transfusão de sangue no Brasil. A prática da doação remunerada era muito comum, mas com a segunda guerra mundial – 1939-1945 – surgiu uma cultura social de doação voluntária em especial na Europa. A Sociedade Brasileira de Hematologia e Hemoterapia, em 1950, contribuiu para a criação de um movimento de conscientização acerca da importância da doação de sangue como um ato voluntário, buscando uma alternativa para a doação remunerada. Na época se verificava uma associação direta entre doações remuneradas e contaminação sanguínea. 

Na Constituição Federal de 1988, o Art. 199, § 4º, proíbe a comercialização do sangue e reforça o dever do Estado em criar meios para um atendimento hemoterápico e hematológico seguro, de qualidade e acessível a toda a população   Esse parágrafo foi regulamentado em 2001 por meio da Lei n. 10.205/2001 (Lei do Sangue ou Lei Betinho, em homenagem a Herbert de Souza brasileiro que contraiu AIDS numa transfusão). Esta lei traz em seu texto a proibição de compra, venda ou qualquer outro tipo de comercialização do sangue, componentes e hemoderivados.

A política de sangue promove campanhas de educação de massa nas escolas, empresas e nos meios de comunicação. Realiza parceria com celebridades, clubes de futebol e influenciadores para atrair a atenção da população jovem. Estimula a criação de unidades móveis de doação, ampliação de horários e aumento no número de locais para doação além de estimular a oferta de incentivos aos doadores. Por exemplo, na EAESP, entidades estudantis promovem doação de sangue voluntária sempre em parceria com serviços públicos ou sem finalidade lucrativa. Outra estratégia possível é a integração com o sistema de saúde, particularmente a Estratégia Saúde da Família, onde a capacitação dos agentes comunitários de saúde pode servir para educar e mobilizar a população local. Também é desejável que se estabeleçam parcerias com hospitais públicos e privados para campanhas integradas envolvendo pacientes e seus familiares. Promover a doação de sangue exige políticas públicas criativas e integradas, que vão além da simples solicitação de doações em períodos críticos. A doação deveria se tornar um hábito cultural, sustentado por educação, acessibilidade e reconhecimento.

O Dia Nacional do Doador de Sangue é uma oportunidade não apenas para celebrar aqueles que já doam, mas também para mobilizar a sociedade a adotar esse gesto solidário como um compromisso contínuo.

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