A crise na Ucrânia e o que está em jogo no tabuleiro diplomático mundial
Não há solução permanente para a crise entre a OTAN e a Rússia porque ambas têm visões conflitantes e irreconciliáveis sobre a arquitetura geopolítica da Europa do Leste. Porém, é possível um acordo que garanta a paz por enquanto. Tal acordo teria que incluir a façanha de convencer a Rússia de que a Ucrânia não fará parte da OTAN no futuro, mas sem explicitar isso, pois os EUA fazerem essa promessa seria o equivalente a formalizar que a Ucrânia pertence à esfera de influência russa – inaceitável para Washington. Um exemplo seria descentralizar a tomada de decisões de política externa da Ucrânia a tal ponto que regiões dominadas por rebeldes pró-russos possam vetar uma adesão da Ucrânia à OTAN. Kiev, obviamente, nunca aceitaria.
Um detalhe importante é que nem os EUA nem a Europa querem que a Ucrânia venha a fazer parte da OTAN neste momento; o país nem sequer iniciou seu processo de adesão. O ganho estratégico para a OTAN é altamente questionável, e uma adesão não teria apoio público. No entanto, no contexto atual, uma promessa explícita, por parte dos EUA, de que a Ucrânia nunca fará parte do bloco seria vista, em Washington, como capitulação às ambições russas na região, e muitos analistas nos EUA acreditam que isso poderia encorajar Moscou a ampliar sua esfera ainda mais. Além desse argumento de encorajar a Rússia, é comum ouvir em Washington que permitir o controle da Ucrânia por Moscou estimularia Pequim a avançar em sua ambição de retomar Taiwan. Pode-se discordar, mas a ideia é influente.
Nesse contexto, vale mencionar o argumento da escritora Anne Applebaum, para quem Putin tentaria retomar controle sobre a Ucrânia mesmo sem a possibilidade de o país aderir à OTAN. Segundo ela, Putin só quer desestabilizar a Ucrânia para controlá-la, independentemente da OTAN. Em meio a isso tudo, paradoxalmente, uma das consequências da crise pode ser o fortalecimento da OTAN. Na Suécia e na Finlândia, que não fazem parte do bloco, a crise geopolítica gerou debate sobre uma possível adesão no futuro. A porta-voz do Ministério de Relações Exteriores da Rússia, Maria Zakharova, já alertou: a adesão da Finlândia e da Suécia à OTAN “teria sérias consequências militares e políticas que exigiriam uma resposta adequada por parte da Rússia”.