A nova Rota da Seda na América Latina
No ano em que celebra o 70º aniversário de fundação da República Popular da China, o governo chinês consolida uma nova diplomacia, mais ativa e global em seu escopo. A principal iniciativa de política externa que melhor traduz esse momento chama-se “Um Cinturão e Rota” (C&R) – forma abreviada para se referir ao Cinturão Econômico da Rota da Seda e à Rota da Seda Marítima do Século XXI. Um ambicioso projeto que conecta a Ásia, o centro e o leste europeu e o norte da África.
O Cinturão e Rota difere dos mecanismos de integração econômica que predominaram na América Latina nas últimas décadas do Século XX por promover, já de início, a conexão dos países pela infraestrutura com apoio de mecanismos de financiamento, tais como os recém-criados Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura (BAII) e o Fundo da Rota da Seda. Este não foi o caso, por exemplo, do Mercosul. Fundado em 1991, deu-se ênfase a um arcabouço jurídico-institucionais e às discussões sobre barreiras tarifárias e não-tarifárias. O Fundo de Convergência Estrutural do Mercosul (FOCEM) só surgiu quinze anos depois.
Em janeiro do ano passado, por ocasião da Segunda Reunião Ministerial do Fórum China-América Latina e Caribe (Fórum China-CELAC), realizada no Chile, o presidente chinês Xi Jinping convidou os países latino-americanos a participarem ativamente do Cinturão e Rota. A Declaração Especial de Santiago declarou que a China "considera que os países da América Latina e do Caribe são partes da extensão natural da Rota Marítima da Seda e são participantes indispensáveis na cooperação internacional do Cinturão e Rota”.
É factível o Cinturão e Rota na América Latina? A China tornou-se o primeiro ou o segundo maior parceiro comercial de vários países da região. Desde 2014, o presidente Xi e demais autoridades chinesas tem visitado os países latino-americanos com uma frequência inédita na história da diplomacia chinesa. Na Reunião de Ministros das Relações Exteriores do Fórum China-CELAC, realizada em 2015, o presidente Xi propôs que o comércio entre os dois lados chegue a US$ 500 bilhões nos próximos 10 anos, e que o investimento direto chinês na América Latina alcance US$ 250 bilhões. Em entrevista para O Globo, o embaixador da China, Yang Wanming, afirmou que o investimento chinês no Brasil é o que mais cresce, com um total acumulado de quase US$ 70 bilhões. Assim, se o mapa original do Cinturão e Rota está geograficamente distante da América Latina, os investimentos e o comércio com a China são, todavia, uma realidade muito concreta. Desde este ponto de vista, estamos integrados à nova Rota da Seda.
No discurso que fez na cerimônia de abertura do Fórum Cinturão e Rota, em 2017, o presidente Xi declarou, respeitando a típica discrição chinesa, que o “Cinturão e Rota não está reinventando a roda”. Mas pelo menos está fazendo-a girar. E num mundo onde o multilateralismo está sob ameaça, tal iniciativa é muito mais que bem-vinda.