Institucional

Panorama internacional dos desafios do hidrogênio verde

Gláucia Fernandes, Matheus Ayello, João Henrique de Azevedo, Felipe Gonçalves

A tensão geopolítica entre a Rússia e a Ucrânia tem forçado vários países a antecipar os seus planos de transição energética, em particular, os investimentos em hidrogênio renovável. A União Europeia colocou em prática o REPowerEU, um plano para reduzir rapidamente a dependência dos combustíveis fósseis russos e acelerar a transição. De maneira geral, as incertezas sobre o gás natural da Rússia, e a necessidade de reduzir a dependência de combustível desse país. De acordo com estudo da Carbon Tracker, ao menos 25 países já se comprometeram a investir cerca de US$ 73 bilhões em hidrogênio verde no último ano. Aproximadamente 14% desses recursos será oriundo dos setores públicos e privados da Alemanha.

Dentre as diversas rotas para produção de hidrogênio renovável ou de baixo carbono, a do hidrogênio verde se apresenta como a mais explorada no momento. O hidrogênio verde é aquele obtido por meio de um processo químico conhecido como eletrólise, em que se utiliza a corrente elétrica de fonte renovável para separar o hidrogênio do oxigênio que existe na água.

Esta fonte de energia tem relevantes aspectos positivos, tais como o fato de ser de baixa intensidade de carbono, ser armazenável e ser versátil. A versatilidade do hidrogênio está relacionada ao fato de o mesmo poder ser transformado em eletricidade ou combustíveis sintéticos com finalidades comerciais, industriais ou de mobilidade. Por outro lado, essa fonte ainda apresenta um alto custo e um maior gasto de energia. Ademais, o hidrogênio é um elemento muito volátil e inflamável, exigindo requisitos de segurança elevados para evitar fugas e explosões.

A Agência Internacional de Energia (IEA) aponta que a produção global de hidrogênio atingiu o patamar de 90 milhões de toneladas em 2020, e a previsão é que esta produção atinja a marca de 200 milhões de toneladas em 2040, no entanto algumas fontes mais otimistas estimam que esse patamar será alcançado logo em 2030.

Aproximadamente 99% do hidrogênio usado como combustível é produzido a partir de fontes não-renováveis e apenas 0,1% a partir da eletrólise. O mercado de hidrogênio verde atingiu o patamar de 300 milhões de dólares em 2020. Seguindo os pesados investimentos que estão sendo feitos no setor, nas projeções da IEA, há uma expectativa de que em 2028 o mercado já movimente cerca de 10 bilhões de dólares. Esse crescimento inclui, não só um aumento do consumo tradicional de hidrogênio, mas também o consumo em novos mercados como o setor de transporte e o setor de energia.

Em um mundo onde clima e meio ambiente têm sofrido cada vez mais os efeitos negativos do uso de combustíveis fósseis, o uso do hidrogênio renovável passou a ser tratado como essencial para descarbonizar diversas atividades. É importante frisar, contudo, que esse gás não é a “bala de prata” contra a crise climática, e sim, mais uma solução na direção desse problema. O hidrogênio renovável é mais um fator essencial para que se atinjam os objetivos firmados na COP27 (27ª Conferência das Partes). Durante o evento realizado em novembro de 2022, no Egito, foi fechado um pacote de 25 ações colaborativas dentro de 5 temas chaves, dentre eles o hidrogênio, que serão entregues na COP28. Este pacote tem como objetivo acelerar a descarbonização para que a meta do Acordo de Paris de 2015, de limitar o aquecimento global a 1,5 graus Celsius até o final do século, seja alcançada.

Com os conflitos na Ucrânia, os cálculos dos custos para a produção de hidrogênio foram impactados, o que não significou um barateamento gás. Segundo estudo PwC, atualmente o custo do “hidrogênio fóssil” é de cerca de US$ 1,4 por quilo de hidrogênio produzido. Já o preço do hidrogênio verde varia entre US$ 5 e US$ 7 por quilo. Todavia, diante dos elevados preços para o gás avindo da Rússia, a indústria tem recorrido a fontes renováveis de energia para produzir o gás verde e cumprir com as metas de net zero emissions. No caso da Europa, entre as medidas para impulsionar o hidrogênio verde, existe a expectativa de substituição do uso de veículos movidos à combustão por outros com combustíveis renováveis.

Próximos passos

Movido pela transição energética global, o hidrogênio renovável e de baixo carbono será economicamente competitivo até 2030. No entanto, para que isso aconteça deverá haver uma forte e contínua união de esforços dos países para uma maior e mais rápida difusão desta nova cadeia produtiva.

O mundo está se preparando para esta transição e os países estão se posicionando estrategicamente para este mercado em ascensão. A cadeia produtiva global vai muito além da planta de produção de hidrogênio. Envolve desde a extração da matéria prima necessária para fabricação de equipamentos de eletrólise como a platina e o irídio, até o estudo de materiais e revestimentos adequados para o transporte de hidrogênio via dutos.

Por fim, é preciso ter uma visão estratégica mais bem consolidada de como o Brasil pode atuar nesta cadeia. Uma política de investimentos adequada para pesquisa e desenvolvimento, aliada a mecanismos de financiamento e incentivos fiscais, será essencial para o amadurecimento e crescimento do mercado.

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Autores

  • Gláucia Fernandes

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