Mudança climática e riscos geopolíticos
As mudanças climáticas e a economia estão intrinsecamente conectadas. Essa relação é bidirecional: o clima impacta o desempenho econômico, e a economia influencia o clima. Mas essa reflexão leva a outra questão fundamental: há uma relação entre mudanças climáticas e conflitos geopolíticos?
Compreender essa dinâmica é essencial, porque a geopolítica orienta decisões políticas e econômicas que afetam todos nós. Geopolítica é um conceito multifacetado que envolve a interação entre geografia, política, economia e estratégia, moldando as relações internacionais e as dinâmicas de poder. No conceito de geopolítica, território e a geografia são centrais. Assim, se mudanças climáticas impactam territórios de maneiras distintas, é razoável supor que também afetam a geopolítica — especialmente em economias altamente dependentes de recursos naturais.
As mudanças climáticas ampliam os riscos geopolíticos por diversos fatores. A escassez de recursos naturais pode gerar disputas por petróleo, gás, minerais e água, essenciais para a economia global, a segurança nacional, provisão de alimentos e subsistência das populações. O aumento do nível do mar e as secas intensificam migrações, pressionam recursos financeiros e naturais e agravam tensões sociais. Comunidades vulneráveis, desproporcionalmente afetadas, enfrentam desigualdades ainda maiores, criando um ambiente propício a conflitos.
Um estudo publicado no Journal of Environmental Management (2024) (*) investigou a relação entre vulnerabilidade climática e risco geopolítico. Com base em uma amostra de 42 países entre 1995 e 2021, os pesquisadores concluíram que países mais vulneráveis às mudanças climáticas são também mais propensos a conflitos geopolíticos.
Para medir a vulnerabilidade climática, o estudo utilizou o índice ND-GAIN (Notre Dame Global Adaptation Initiative), que avalia a capacidade de um país de lidar com mudanças climáticas em seis áreas essenciais: segurança alimentar, disponibilidade de água, acesso à saúde, preservação dos ecossistemas, resiliência urbana e infraestrutura de transporte. Já o risco geopolítico foi mensurado pelo índice GPR (Geopolitical Risk), baseado em eventos negativos relatados por veículos como The New York Times, The Wall Street Journal e The Guardian, entre outros. O índice abrange ameaças de guerra, ameaças à paz, crescimento da importância militar, ameaças nucleares e terroristas, início de guerra, escalada de guerra e atos de terrorismo.
Analisando a relação vulnerabilidade climática e conflitos geopolíticos por meio de uma análise multivariada, os autores concluíram que países com maior vulnerabilidade às mudanças climáticas são mais propensos a experimentar conflitos geopolíticos. No entanto, mostrou também que países com instituições e governança voltadas à adaptação climática conseguem mitigar, ao menos parcialmente, esses riscos.
Essa conclusão traz aprendizados relevantes para o Brasil, cuja economia depende fortemente de recursos naturais.
Primeiro, políticas públicas e governança que incorporem os riscos climáticos podem reduzir nossa exposição a conflitos geopolíticos — ou, ao menos, minimizar seus impactos.
Segundo, embora o estudo tenha foco nacional, suas implicações também se aplicam ao setor corporativo. Empresas precisam de estabilidade política e econômica para operar. Conflitos geopolíticos geram incertezas que afetam estratégias e investimentos de longo prazo. Dessa forma, companhias que integram riscos climáticos em sua governança contribuem para a proteção de valor econômico — uma espécie de seguro contra instabilidades. Esse efeito se amplifica quando há alinhamento com iniciativas nacionais, beneficiando tanto o país quanto as empresas.
Ignorar a conexão entre mudanças climáticas e geopolítica é um erro estratégico. A transição para uma economia resiliente ao clima é uma necessidade econômica e de segurança nacional (e corporativa). Os líderes que entenderem isso têm a chance de influenciar o futuro; os que não entenderem serão arrastados pelas crises.
(*) Fonte: Alam, A., Banna, H., Alam, A. W., Bhuiyan, M. B. U., & Mokhtar, N. B. (2024). Climate change and geopolitical conflicts: The role of ESG readiness. Journal of Environmental Management, 353, 120284.
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