Pesquisa mostra que poluição pode impactar no desempenho escolar dos estudantes
Não é novidade que impactos negativos no meio ambiente são capazes de gerar inúmeras consequências para o mundo e para a sociedade. No entanto, para além das mudanças climáticas, e os riscos econômicos ocasionados pela poluição, pesquisadores da Escola de Políticas Públicas e Governo da Fundação Getulio Vargas (FGV EPPG), em Brasília, investigam o impacto que a qualidade ambiental pode ocasionar na capacidade cognitiva das pessoas, sobretudo no desempenho escolar de crianças e adolescentes.
De acordo com o pesquisador que lidera o grupo de estudo, Weeberb Réquia Júnior, quanto maior a poluição ao redor das escolas, menor é o nível de cognição dos estudantes, o que acarreta em menor desempenho escolar. Ele afirma que esta hipótese já foi provada em outros países da Europa e nos Estados Unidos, mas que no Brasil era uma investigação inédita até que foi comprovada também no Distrito Federal, e que agora com o financiamento da FGV, em parceria com o CNPq, a pesquisa vai focar em analisar dados para fazer esta avaliação a nível nacional.
“Através de análises que envolvem técnicas avançadas em geoestatística e bioestatística, os resultados deste estudo podem contribuir com políticas públicas em educação, em saúde, e óbvio, em meio ambiente. Nosso objetivo maior é proporcionar que os estudantes alcancem o máximo do potencial acadêmico e desenvolvimento fisiológico”, disse o pesquisador, ao ressaltar que a qualidade ambiental também pode influenciar positivamente, pois a quantidade de áreas verdes ao redor de escolas pode proporcionar benefícios no aprendizado.
Weeberb explica como este processo se dá em prática: “Suponha que em uma região bastante urbanizada e movimentada da sua cidade tenha um colégio, no qual os alunos passam grande parte de seus dias. Lá, eles ficam expostos a qualidade ambiental daquele lugar e quando uma criança ou adolescente respira o ar poluído, os gases e particulados atmosféricos atingem diversos órgãos no corpo humano, comprometendo o funcionamento dos sistemas respiratório, circulatório e até mesmo o sistema nervoso, capaz de impactar no desempenho cognitivo. Apesar de esses fatores impactarem em resultados de provas, como por exemplo no Enem, é necessário entender que antes ocorreu este processo biológico".
Investigando os dados
Para executar a pesquisa, serão realizadas análises de nível individual, o que concede maior poder estatístico. Ao todo, serão acessados dados individuais de todos os alunos que fizeram o Enem no Brasil, entre 2000-2019, nos quais serão aplicados a técnicas de análises espaciais, capazes de estimar a qualidade ambiental ao redor das escolas de cada aluno. O professor ressalta que essas informações estão presentem nos micro dados do Enem. Segundo ele, a qualidade ambiental será representada por quatro fatores: poluição do ar, áreas verdes, variações climáticas e queimadas florestais.
Após o levantamento dos dados, o projeto irá desenvolver dois indicadores baseados no nível de exposição ambiental e no impacto da exposição no desempenho escolar, o primeiro representado pela concentração de poluentes atmosféricos ao redor da escola, a quantidade de áreas verdes por km², variações de temperatura e a quantidade de áreas queimadas por incêndios florestais. Já o impacto da exposição ambiental no desempenho escolar dos alunos será associado pelas variáveis de exposição e o desempenho no Enem.
Além disso, outras bases de dados serão utilizadas, de organizações a exemplo da NASA, do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Especificamente para áreas verdes, será utilizado o Normalized Difference Vegetation Index (NDVI), considerado um dos mais consistentes indicadores de áreas verdes decorrentes de sensoriamento remoto.
Impacto em políticas públicas
Nos últimos anos, os estudos sobre os impactos ao meio ambiente se diversificaram proporcionando conhecimentos capazes de avaliar, por exemplo, desigualdades ambientais e fortalecendo a qualidade sanitária e ambiental como determinantes sociais da saúde, que influenciam na qualidade de vida da população. No entanto, de acordo com o pesquisador Weeberb, que também estuda o impacto ambiental em outros âmbitos, como a saúde, ainda são poucos os estudos que se debruçam a analisar o impacto ambiental no processo cognitivo dos indivíduos.
“Evidências têm mostrado que crianças e adolescentes podem sofrer efeitos negativos quando são expostos à baixa qualidade ambiental ao redor das escolas, que reduzem capacidade cognitiva dos estudantes e resultam em baixo desempenho escolar. Por isso, este projeto busca aprofundar essas investigações no Brasil para verificar a associação entre exposição ambiental e desempenho acadêmico dos alunos de ensino fundamental e médio”, explicou.
Além de buscar validar a hipótese a nível nacional, espera-se contribuir com conhecimentos em temas relacionados à exposição ambiental e desempenho acadêmico de adolescentes, capazes de embasar políticas públicas. “Também são objetivos do projeto repassar essas informações para as autoridades de meio ambiente, planejamento urbano, saúde e educação, a fim de orientar políticas públicas e produzir mapas com indicadores que facilitem a mobilização de recursos direcionadas às regiões prioritárias”.
Produtos
Enquanto a pesquisa para comprovar as informações a nível nacional está em andamento, Weeberb declara que além da influência escolar, ele também estuda a influência do meio ambiente na saúde, investigando junto a outros pesquisadores de universidades nos EUA e Europa como a qualidade ambiental se relaciona com a saúde dos indivíduos. “Já foi comprovado que queimadas, poluição, desmatamento, variação de temperatura, são fatores que se relacionam com a ocorrência de internação hospitalar, mortalidade, nascimento de bebês com baixo peso e bebês prematuros”.
É possível conferir tanto o estudo sobre a qualidade ambiental no processo cognitivo dos estudantes no Distrito Federal, quanto outros estudos sobre o impacto do meio ambiente na saúde e no aprendizado, através desse link.
Apoio e financiamento
Esta pesquisa contou com o financiamento do Fundo de Pesquisa Aplicada da FGV (FPA FGV), que desde 2014 apoiou mais de 271 projetos, selecionados pela Comissão de Pesquisa e Inovação. Além da FGV, este projeto conta com colaborações de pesquisadores de universidades canadenses e americanas dando continuidade às investigações coordenadas pelo professor Weeberb no Brasil, que também são financiadas pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
Pesquisa Científica Aplicada
A pesquisa científica aplicada é o principal foco da Rede de Pesquisa e Conhecimento aplicado da FGV, criada em 2016, com o objetivo de incentivar o desenvolvimento de pesquisas com excelência, alto impacto em diferentes âmbitos da sociedade e elevado grau de inovação. Ao propor diferentes processos e soluções para os desafios enfrentados pela população brasileira, as pesquisas vão de acordo com a missão da Fundação de promover o crescimento socioeconômico do Brasil.